quinta-feira, 30 de agosto de 2012

n.3 - ago/2012: Uma tragédia anunciada?

Alguns podem pensar que eu faço propaganda de alguma rede de TV, mas menciono tais reportagens e canais de TV, pois são importantes na questão da divulgação científica. Essa semana no Globo Repórter vai ao ar uma reportagem sobre o cuidado com o idoso. Esse é um tema que é estudado por diversas áreas do conhecimento e também da demografia. E qual a importância de nos preocuparmos com o processo de envelhecimento no Brasil? Vejamos: ainda há no imaginário social o fato de que o Brasil é um país jovem, fato que se reflete na demagogia dos políticos que prometem construir mais escolas ao invés de propor uma melhoria no ensino; mas isso não é mais tão verdadeiro nem o será no futuro.

O Brasil possui hoje uma grande concentração de pessoas em idade adulta. Em torno de 67% da população possui entre 15 e 64 anos de idade, ou seja, praticamente 7 em cada 10 brasileiros está no grupo de idade que chamamos de População Economicamente Ativa. Isso nos coloca em uma situação particular, pois considerando um momento de crescimento econômico do país, facilita e melhora as possibilidades de se dispor de mão-de-obra para o desenvolvimento do país. É o que muitos autores chamam de "janela de oportunidades" ou "bônus demográfico". Isso ocorre devido ao processo de transição demográfica que desde meados da década de 1970 tem resultado em um número cada vez menor de nascimentos de crianças a cada ano. Assim, em um ritmo muito acelerado se comparado ao mesmo processo que ocorreu em países da Europa, por exemplo, o Brasil passou de uma estrutura de população jovem, para uma população de adultos.

Mas essas oportunidades vão passar rapidamente quanto surgiram e rapidamente se tornará um país envelhecido. Hoje a proporção de pessoas com mais de 65 anos de idade é de cerca de 6,8% e a despeito de políticas sociais e legislação específica para dar mais atenção aos idosos, vemos grandes lacunas a serem enfrentadas. Viver mais, não é reflexo de viver bem em grande parte dos casos. Assim, o cuidado com a saúde deve se tornar um grande desafio para as políticas públicas. Você pode pensar, vai piorar? Sim, se não melhorarmos o sistema de saúde, haverá um estrangulamento completo da saúde brasileira. Mas não basta pensar no tratamento das doenças, mas também em prevenção de doenças para que os idosos tenham uma vida mais longa, mas ao mesmo tempo mais saudável.

Com uma população mais envelhecida, o perfil das doenças dos brasileiros também tendem a mudar, pois muitas delas serão doenças crônicas (diabetes, hipertensão, etc) que, sem cura, deverão manter o idoso constantemente fazendo uso do sistema de saúde. Além disso, haverá a necessidade da qualificação da infraestrutura pública para melhorar a mobilidade desse aumento do contingente de idosos. Para quem depende do transporte coletivo hoje, imagine subir num ônibus com dificuldades de locomoção em uma velocidade de reflexos reduzida? E ainda, o que deve ser o tema da reportagem mencionada anteriormente, há a necessidade de qualificar melhor os serviços de cuidados domiciliares com idosos como enfermagem, terapia ocupacional, etc. Com uma geração de idosos com poucos filhos, não deverá haver mais a mesma estrutura de redes familiares para o cuidado dos idosos que evitem a necessidade da profissionalização deste cuidado doméstico.

Em 2050, serão cerca de 23% da população brasileira com 65 anos ou mais. Praticamente um em cada quatro brasileiros estarão neste grupo populacional. Considerando os investimentos que são feitos hoje na saúde dessa população, grande parte vai ter problemas de saúde crônicos que merecerão cuidados específicos. Eu serei uma das pessoas que estará contribuindo com os números idosos, em 2050 terei 75 anos. Provavelmente terei recursos para auto-financiar os meus cuidados necessários no futuro, mas com certeza essa não será a regra para a população brasileira em geral. Pense nisso...

Para saber mais:

Enfim só: um olhar sobre o universo de pessoas idosas que moram sozinhas no município de Belo Horizonte (MG), 2007

Familias e cuidado dedicado ao idoso: como o tamanho e a estrutura da rede de apoio influenciam o tempo individual dedicado à atenção ao idoso

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Um comentário:

Anônimo disse...

Parabéns pelo texto e pelo alerta Prof. Ojima, tenho tentado trabalhar essa temática para o estado de Sergipe. Sigo acompanhando seu blog.